quarta-feira, 28 de julho de 2010

O Amigo.

Era um almoço de terça feita bem comum, com todos reunidos ao redor da mesa, uma tradição familiar. Postas de badejo fritas no azeite com molho de manteiga com alcaparras, além disso, purê de batata e arroz. Simples mas delicioso. Quebrando a rotina daquela família toca o telefone, e a mãe que havia acabado poucos instantes antes, se levantou para atender.

“Oi, olá, tudo bem, como vai, bem obrigada e você?” Depois de breve conversa ela para ao lado de seu primogênito – “Ah, para ele? Tudo bem, só um segundo” – estende o telefone e fala:


– É o Thiago, filho do Julio.


O filho mais velho conhecia o Thiago, na verdade, já tinha ido a casa desse Júlio, colega de trabalho de sua mãe, algumas vezes, e tivera uma péssima impressão. Eram pessoas diferentes, não impunham limites aos filhos, lá cada um fazia o que queria, praticamente uma anarquia. Porém por não conhecerem muita gente naquele país estranho, tinha tentado fazer amizade com esse Thiago, que era alguns anos mais novo, com resultados pouco animadores. O chamara para tomar uma cerveja em três ocasiões e, em duas delas, ficara a ver navios, levou bolo do cara. Na última tentativa resolveu se vingar não indo ao lugar marcado, porém nada adiantou, pois o garoto lhe mandou uma mensagem de texto 15 minutos após o horário combinado avisando: “kra, nem vai dar, abs”. Desde então nunca mais tivera contato com o thiago, estava extremamente curioso para ver aonde iria parar aquela conversa:

- Alô?

- Oi.

- Oi Thiago, tudo bom?

- Tudo e contigo?

- Tudo também...

- Cara, to te ligando pra te chamar pra sair.

- ...

- É que sexta feira eu vou jogar tênis com um amigo, e pensei que talvez você quisesse se juntar a nós.


Pensou seriamente em dizer não, iria jogar na cara do moleque as três vezes que ficou no vácuo, e diria que não ia de jeito nenhum jogar tênis com ele. Estava decidido quando levantou os olhos e viu sua mãe. Ela, mulher trabalhadora, sustentava sozinha a casa e os quatro filhos, já que o marido por problemas burocráticos não podia trabalhar. Não podia fazer isso com ela, vai que depois o moleque decide contar pro pai, que vai começar a chatear. Não. Melhor aceitar e ver no que vai dar, estava muito estranha a situação.


- E então? Você vem?

- Ah, pode ser Thiago, mas aí, aonde e que horas?

- Nem se preocupa com isso, não está decidido ainda, mas na quinta a noite eu te ligo, vai ser na sexta de manhã.

- Ta bom, até sexta então.

- Ta.

- ...

- Cara, também queria te pedir uma coisa.


Arrá! Sabia que havia algo errado nessa história, nunca aquele garoto ia ligar sem alguma segunda intenção. Um sorriso singelo, e irônico, brotou em seus lábios, “vamos ver o que esse cara quer”, pensou.


- Hum.

- Então, não é nada de mais, mas é que eu soube que você tem um Wii, certo?

- Certo.

- Pois é, eu estou com meus primos aqui, e eles queriam jogar um jogo de futebol, por acaso você tem FIFA?

- Tenho sim, mas não vai rodar no seu Wii, porque o meu é europeu, é um sistema diferente.

- Ah, mas a gente sempre pode tentar né? Vai que funciona...

- Se você quiser mesmo pode tentar, mas não vai funcionar, os sistemas são completamente diferentes, eu precisei desbloquear meu Wii para poder jogar jogos daqui...

- Ta bom, ta bom, mas quando que eu posso apanhar eles?

- Eles?

- É, eu aproveito que estou aí e vejo se tem mais algum jogo que meus primos possam gostar!

- A hora que você quiser pra mim está bom, você vai vir amanhã?

- Eu vou agora mesmo, pego a bicicleta e em dez minutos chego aí.

- Beleza, pode vir então.


Após desligar o telefone, riu da situação e comentou com a família, avisou que estaria no quarto quando o Thiago chegasse, e foi usar o computador. Alguns minutos depois alguém abre a porta do seu quarto (sem bater, óbviamente), é o dito cujo, que já ostenta dois jogos na mão.


- Seu pai falou pra te chamar aqui, mas aí eu passei pela sala de televisão e já escolhi os jogos que eu quero.

- Ta, beleza... Não vai funcionar, mas boa sorte.

- De boa, vou correr agora que quero voltar logo pra casa.


Desceram as escadas e se despediram na porta, Thiago ainda falou que ligaria na quinta antes de sair.

Quinta feira foi um dia tranqüilo, ele foi pra faculdade e na volta deitou pra ficar vendo “The Sopranos”, viu quase uma temporada inteira, quando adormeceu com o computador ao lado. Acordou no dia seguinte só ao meio dia, achou estranho que o celular não tivesse tocado com o Thiago dizendo o local do jogo. Levantou e foi direto olhar o aparelho, onde nenhuma mensagem ou chamada perdida constavam.

Já faz vinte dias que os jogos, que não funcionam, estão na casa do Thiago, ele nunca mais ligou, ou veio devolve-los.

4 comentários:

Bruno disse...

Beleza. Agora publica um próximo post dizendo que é mentira, por favor.

E, putz, fiquei interessado no tal badejo ao azeite com manteiga e alcaparras.

Pedro Lucas Rocha Cabral de Vasconcellos disse...

Infelizmente de mentira não tem nada...

E o badejo é realmente delicioso, qualquer peixe com molho de manteiga com alcaparras é bom, mas esse fica espetacular!

Lucas Martins disse...

preciso postar minha interpretação pro destino desses games, pedro? kkkkkkkkkkkk

rod disse...

cara...pegar coisa de wii dos outros é pecado D: