sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

O Assédio.


Eu nunca fui muito fã de música, estranho eu sei, principalmente para alguém de 18 anos, mas acontece. Fique claro que gosto de música, só não sou louco, fanático. A não ser que eu goste muito de uma canção, não consigo passar meu tempo escutando, ao contrário, como sei mais ou menos o tempo de duração delas, fico contando na cabeça os minutos que já se passaram, não consigo abstrair. Eu me distraio mais facilmente olhando a paisagem e pensando do que com fones de ouvido, porém de longe meu maior passatempo é a leitura.

Estava eu há algum tempo atrás lendo a série "A Busca do Graal" de Bernard Cornwell, mas fiquei sem grana e, ao final do segundo livro, passei duas semanas sem poder comprar o último da trilogia. Nesse ínterim achei que seria uma boa tirar o Ipod da gaveta, quem sabe escutar uns nerdcasts nos tempos ociosos de ônibus e Metro.

E durante essas duas semanas, num fatídico sábado a tarde, me encaminho para o Metro para o que eu esperava fossem 40 minutos de Azaghal e cia falando de um assunto nerd aleatório, ledo engano... Assim que entrei no vagão do metro e devia ter desconfiado de algo, tinha um lugar para sentar, e na estação botafogo as 4 horas da tarde de sábado, sentido linha 2, nunca tem lugar pra sentar, é a saída da praia.

Achei que estava com sorte (sic), e me sentei feliz e contente com meus fones de ouvido sem nem prestar atenção a quem estava ao meu redor. Hoje repensando meus passos percebo quantas coisas fiz de errado, mas na época não achei que o senhor de cara simpática ao meu lado fosse me causar problemas.

Algumas estações depois, ouço sons indistintos vindo de onde o senhor estava e, como qualquer pessoa normal que estivesse usando fones de ouvido, ignorei completamente, afinal quem em sã consciência iria ser indelicado ao ponto de interromper alguém que claramente estava fazendo outras coisas?

O velho.

Após ser sumariamente ignorado, o velho ao meu lado repete o que quer que tenha dito e cutuca meu braço. Eu, como bom garotinho ingênuo que era, me virei, fiz a maior cara de falta de paciência que consegui, tirei o Ipod do bolso, dei pause, retirei um dos fones e perguntei:

- O que? (Largo do Machado, ainda estamos no Largo do Machado?)

- Você é um garoto muito bonito sabia?

Pronto, começamos mal. Uma pessoa normal teria levantado, saltado na primeira estação e esperado o próximo Metro, mas eu já estava atrasado para o meu futebol, e não ia ser um velho esquisito que ia me fazer ficar na "de fora". Além disso eu não consigo ser muito brusco ou mal educado com as pessoas, tenho uma necessidade, as vezes irritante, de ser polido.

Porém mesmo com tudo isso devo ter feito uma cara que assustou o velho, pois logo em seguida ele complementou:

- Não leve a mal, estou falando porque você se parece muito com meu neto, sabia?

-Ah, obrigado...

-É sim, se parece muito com ele, você quer ver uma foto dele?

Foto? como assim foto, na hora fiquei paralisado, mas pensei em uma estratégia para dar a entender que não queria papo, ele não podia ser tão obtuso assim...

-Não sei se é uma boa, tirar a carteira em público está cada vez mais perigoso! (Catete, Glória, já estou quase na metade)

Falei e rapidamente fui recolocando os fones no ouvido, mas quando estava quase achando que tinha me safado o velho segura minha mão e diz:

- Está mesmo, o Rio de Janeiro anda muito perigoso, mas é por isso que eu ando sempre com a foto no bolso da camisa, sabia?

Como a mão dele ainda estava segurando meu pulso, tive que concordar e continuar a conversa, o dilálogo que segue é uma cópia fiel dos acontecimentos daquele sábado de 16:20 até as 16:40, os 20 minutos mais longos da minha vida...

- Olha meus netos aqui, esse é o mais velho que se parece com você.

- Legal. (Meu Deus, ainda na Carioca?)

- Só que ele é bem mais novo, tem só 12 anos, não tem idade para namorar ainda, você tem namorada ... Qual é seu nome mesmo?

- Pedro, e sim, tenho namorada.

- Ah, e ela tem 16 anos que nem você?

- Eu tenho 19, e ela também. (Uruguaiana, já está quase na Tijuca)

- Que beleza, 19 anos, bons tempos...

- E me diz uma coisa Pedro, vocês já... já... transaram?

E você pode achar que chegamos ao fundo do poço, mas acredite, nada é tão ruim que não possa piorar...

O velho quando falou isso, não falou com o tom de voz normal de uma pessoa de quase oitenta anos, ele falou como se estivéssemos os 2 a 150 metros de distância com um trem passando entre a gente... de modo que as 2 pessoas sentadas atrás da gente caíram na risada, e todo mundo no vagão começou a nos encarar.

Eu obviamente não respondi, pois estava muito ocupado tentando ficar invisível ou entrar em combustão instantânea, infelizmente não consegui nenhum dos dois... E como eu não respondia o velho insistiu:

- Sabe, sexo? Molhar o biscoito?

- Não! Não fizemos! (Me diz que já cheguei na Saens Peña, ah não, Praça Onze?)

- Ah, mas você já fez né? Um garoto aprumado como você já deve ter feito muitas menininhas felizes.

Nisso, finalmente percebendo que todos estavam acompanhando o show, ele dispara:

- Esse assunto te deixa desconfortável?

- Sim, muito

- Ah ta, então não falo mais, mas vou te dar um macete, se você conseguir que ela sente no seu colo com o negócio duro, aí já ta meio caminho andado, sabia?

A minha resposta foi um som que nenhuma sonoplastia que eu conheça pode reproduzir, foi um misto de último suspiro de um tigre tibetano com primeiro som emitido por um ornitorrinco, algo bem suave, talvez o velho nem tenha ouvido, pois metade do vagão caiu na gargalhada, o que pelo menos serviu para desviar um pouco a atenção da outra metade.

Nesse ponto finalmente tínhamos chegado a Afonso Pena, duas estações antes de onde eu deveria descer, e uma antes da que o velho tinha afirmado que desceria, porém ele não satisfeito fala:

- Eu ia descer na próxima sabia? Mas acho que vou descer só nas Saens Peña, aí conversamos mais um pouco.

- (NÃÃÃO) Ah.. Que ótimo...

- Pois é! por exemplo, você corta suas próprias unhas do pé?

Aí eu quase me animei, depois de uma pergunta dessas, eu só podia estar numa camera escondida, tava na hora do produtor sair de algum lugar e me fazer assinar uma autorização para usar minha imagem... Porém ninguém apareceu, e o Velho ainda queria que eu respondesse, mas como eu já estava começando a ficar com raiva, fiquei calado.

- Eu não consigo mais cortar as minhas, sabia? Para isso tenho uma acompanhante muito gostosinha, se você quiser posso te apresentar!

- Ah, não, mas muito obrigado.

- Bom, fica com o meu cartão, meu nome é Paulo Miranda, você nem perguntou... Me ligue a hora que quiser se precisar de alguma coisa, e venha lá em casa na terça a tarde para conversarmos melhor ta bom?

- Claro, estarei lá!

Aproveitando a deixa, levantei e fui para a porta rezando para que ele não tentasse vir atrás de mim ou que, pelo menos, tivesse um ataque cardíaco e nunca mais assediasse garotos no Metro.

Consegui chegar no futebol a tempo, joguei bem, fiz gols. Porém nada vai apagar o trauma que sofri naquele dia, e se você estiver interessado no fim que levou o cartão do Sr. Paulo, eu o guardo até hoje, para me lembrar que, inexoravelmente, "a humanidade não deu certo"

Esse post é dedicado a Rob Gordon, pois pelo visto não só com ele essas coisas acontecem.


6 comentários:

Bruno disse...

Esses tiozões não enganam. Como diria o Didi: "hu-hum, ele camufla".

E se a Humanidade tivesse dado certo, a gente ia escrever sobre o quê, pô? :P

Ana Clara Abreu disse...

Sabia que fazer ela sentar no seu colo com o seu pau duro é meio caminho andado?

HUAHUAHAUHAUHAUAHUAHUAH

x**

rod disse...

Ok, eu ri. Fato. Por que eu nunca presencio cenas assim no metrô?

ThiagOrnelas disse...

Oxi, Pedrão, que situação hen.
Texto muito maneiro, bem escrito...permite-nos fácil, fácil imaginar suas expressões.kkk. Fui lendo e rindo, RINDOOO, principalmente com os parenteses.RS
aH, E Definitivamente a humanidade não deu certo, mas essa é a graça pow...Somos um erro(oO??)
E eu, espantosamente, já havia pensado nisso uma vez em que tive que presenciar a patética ação de um "tiozão" ao, repentinamente, meter a mão no pau do muleque mijando num desses banheiros´públicos da vida. Imagina o que o muleque não aprendeu.kk
Será esse o papel dos tiozões?Será que todos eles resolveram ir a caça de "menininhos"?kkk
Ah, mas pára...vai dizer que tu não aprendeu algo nessa história?
1 - Um banco vazio no metro em horário de rush é para continuar vazio(Putz, aprendi isso qnd entrei no vagão feminino por ser o único com vaga).;
2 - Mamãe estava certa quando eramos mais novos, "não podemos dar papo a estranhos", ainda mais estranhos estranhos.
3 - Peça sempre um tiozão para produzir uma dessas cenas, o futuro no futebol é certo.(kk)

Grande abraço, eterno calouro.
Continue mandando-nos suas pérolas na conexão Brasil-Canada.

ThiagOrnelas

Otavio Oliveira disse...

ohaohahoahoaoh PQP. PQP, pedro. MOLHAR O BISCOITO???? haohahoaohaho

Pedro Lucas Rocha Cabral de Vasconcellos disse...

Yep, molhar o biscoito...

E eu cortei algumas partes pq ele falava muito o velho...